Aposentadoria Especial no RPPS após a EC nº 103/2019
- Thiago Marques
- 28 de abr.
- 13 min de leitura
Larissa Búgida Aguiar de Carvalho, advogada, OAB/CE 36.518
Tel. (85) 9 9787 7572
Introdução
A aposentadoria especial de servidores públicos é o benefício previdenciário concedido em condições diferenciadas, destinado a proteger aqueles que exerceram atividades sob riscos ou condições insalubres, ou que possuem alguma deficiência, conforme previsão do art. 40 da Constituição Federal. Antes da Reforma da Previdência de 2019, a Constituição já permitia aposentadorias com requisitos diferenciados para servidores com deficiência, servidores em atividades de risco e servidores expostos a agentes nocivos (insalubridade), mas condicionava tudo a uma lei complementar que nunca foi editada. Na ausência dessa lei, o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula Vinculante nº 33 determinando a aplicação, no que couber, das regras do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) sobre aposentadoria especial aos servidores públicos, até a edição da lei complementar específica. Com a publicação da Emenda Constitucional (EC) nº 103/2019, essa situação sofreu alterações significativas. A seguir, analisam-se as principais mudanças trazidas pela EC 103, os critérios atualmente exigidos para a concessão da aposentadoria especial no Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) e o papel da Portaria MTP nº 1.467/2022 e das diretrizes oficiais da Secretaria de Previdência nessa matéria.
Mudanças trazidas pela EC nº 103/2019
A EC nº 103/2019 (Reforma da Previdência) promoveu uma reformulação nas regras das aposentadorias de servidores públicos. Em relação à aposentadoria especial no RPPS, a Emenda manteve a regra geral de vedação de critérios diferenciados, porém explicitou as exceções e inseriu novos parágrafos (4º-A, 4º-B e 4º-C) no art. 40 da Constituição Federal. Esses dispositivos autorizam, por lei complementar de cada ente federativo, a definição de requisitos diferenciados de idade e tempo de contribuição para três hipóteses específicas: (i) servidores com deficiência (avaliados por perícia biopsicossocial); (ii) servidores que exerçam atividades de risco (como policiais e agentes penitenciários ou socioeducativos); e (iii) servidores cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde. Fora desses casos, permanece proibida a adoção de regras especiais de aposentadoria.

Um dos pontos centrais da reforma foi exigir a comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos, vedando a caracterização por categoria profissional ou ocupação. Ou seja, a EC 103/2019 proibiu o reconhecimento de aposentadoria especial apenas pelo nome do cargo (por exemplo, enfermeiro, médico, eletricista, etc.) sem prova da exposição efetiva aos agentes prejudiciais. Essa mudança reforça a necessidade de laudos técnicos e critérios objetivos para concessão do benefício, alinhando o RPPS à lógica já existente no RGPS.
Outra mudança importante trazida pela reforma foi a vedação da conversão de tempo especial em tempo comum para período laborado após a entrada em vigor da Emenda (13/11/2019). A EC 103 incluiu na Constituição e em seu texto transitório dispositivos que permitem a conversão do tempo especial em comum apenas em relação aos períodos anteriores à reforma, mas proíbem tal conversão para períodos posteriores. Conforme a regra expressa, o tempo trabalhado sob condições especiais após 13/11/2019 não pode mais ser convertido em tempo comum para fins de completar requisitos de aposentadoria, seja no RGPS seja em qualquer RPPS. Essa vedação consta, por exemplo, do §14 do art. 201 da CF (incluído pela EC 103) e do art. 25 da própria Emenda, tendo também sido reproduzida para o regime próprio da União (art. 10, §3º da EC 103). Assim, extinguiu-se a prática anterior de utilizar o fator de conversão (como 1,2 para 25 anos) para aproveitar tempo especial como comum no período pós-reforma.
A EC 103/2019 também inovou ao estabelecer a possibilidade de exigência de idade mínima nas aposentadorias especiais. Embora a definição exata das idades e tempos esteja a cargo de leis complementares de cada ente, a reforma desconstitucionalizou as regras detalhadas de elegibilidade, sinalizando que os critérios diferenciados poderão incluir uma idade mínima além do tempo de contribuição especial. No RGPS, por exemplo, a EC 103 passou a exigir idades mínimas (55, 58 ou 60 anos, conforme o grau de insalubridade) para aposentadoria especial dos segurados do INSS. Para os servidores públicos federais, a reforma aplicou imediatamente regras semelhantes, enquanto para os estados e municípios foi criada uma norma transitória específica, como veremos a seguir.
Por fim, a Reforma da Previdência trouxe regras transitórias para assegurar continuidade de direitos até que cada ente edite sua lei complementar. No âmbito da União, a EC 103 previu normas transitórias para as aposentadorias (art. 10, incisos e parágrafos), inclusive determinando a vedação da conversão de tempo especial no período de transição. Já para os estados, Distrito Federal e municípios, o texto transitório da EC 103 estabeleceu que, enquanto não houver alteração na legislação interna de cada ente, continuam aplicáveis às aposentadorias especiais dos servidores as normas constitucionais e infraconstitucionais vigentes antes da reforma. Em outras palavras, a própria EC 103 garantiu, no §3º do art. 21 do seu texto, que os entes subnacionais poderiam continuar seguindo as regras antigas (anteriores a 13/11/2019) até que aprovem suas leis complementares adequando-se à reforma. Essa disposição transitória evitou um vácuo jurídico e, na prática, fez com que nada mudasse de imediato para os servidores estaduais e municipais no tocante à aposentadoria especial, até a edição de normas locais.
Critérios atuais para concessão da aposentadoria especial (RPPS)
Atualmente, passados alguns anos da EC 103/2019, os critérios para concessão da aposentadoria especial no RPPS dependem do ente federativo e da existência (ou não) de legislação complementar local. No nível federal (servidores da União), a aplicação das novas regras da reforma é imediata, embora ainda não exista lei complementar específica. Em razão da Súmula Vinculante 33 do STF, interpreta-se que os servidores federais devem observar as regras do RGPS adaptadas pela EC 103. Assim, por analogia, um servidor da União exposto a agentes nocivos precisará cumprir 25 anos de efetiva exposição (ou 20 ou 15 anos, conforme o caso do agente insalubre específico) e atender a uma idade mínima – tal como definida no RGPS pós-reforma (por exemplo, 60 anos de idade para agentes de 25 anos de tempo especial) – além dos requisitos gerais de tempo no serviço público (hoje 20 anos no serviço público e 5 anos no cargo efetivo, nos termos do art. 40, §1º, III, da CF, com redação da EC 103). Já os servidores dos estados e municípios, em sua maioria, ainda seguem temporariamente as regras anteriores, por força do art. 21, §3º, da EC 103/2019 citado. Isso significa que, na prática, muitos entes subnacionais continuam concedendo aposentadoria especial com 25 anos de tempo de atividade insalubre, sem exigência de idade mínima, desde que comprovada a exposição nociva, exatamente como ocorria antes da reforma. Todavia, essa aplicação das regras antigas é provisória e vale apenas até que cada ente edite sua própria lei complementar regulamentando a matéria de acordo com os parâmetros da EC 103.
Em qualquer caso, alguns critérios técnicos seguem comuns e vêm sendo exigidos para a comprovação do direito à aposentadoria especial no RPPS:
Comprovação documental da exposição a agentes nocivos: O servidor deve demonstrar, por meio de laudos técnicos (como LTCAT – Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho) e formulários como o PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário), que exerceu suas atividades sob condições especiais que prejudicam sua saúde ou integridade física, de forma permanente e habitual. A Portaria MTP 1.467/2022 e normas anteriores alinharam os procedimentos dos RPPS aos do RGPS nesse aspecto, requerendo prova técnica da exposição e enquadramento nos agentes nocivos previstos em regulamento.
Tempo mínimo de contribuição especial: Via de regra são exigidos 15, 20 ou 25 anos de efetivo trabalho em condições especiais, conforme a natureza do agente nocivo. Por exemplo, para agentes químicos/físicos de médio risco biológico costuma-se requerer 25 anos; para exposição de risco moderado (como trabalho em minas subterrâneas não tão profundas), 20 anos; e para riscos máximos (como mineração de subsolo em frente de produção), 15 anos – seguindo parâmetros análogos aos do RGPS (Lei 8.213/91, art. 57). A definição exata depende da legislação de regência (se existente) ou, na falta, da interpretação dada com base na legislação federal previdenciária vigente na época aplicável.
Idade mínima (quando aplicável): Após a EC 103, passou a ser possível a exigência de idade mínima para aposentadoria especial. No âmbito federal, a interpretação é de que já se aplicam as idades mínimas introduzidas pela reforma (por exemplo, 55 anos para atividades de risco máximo, 58 para risco moderado e 60 anos para risco baixo, aplicáveis tanto a homens quanto mulheres). Entretanto, em diversos RPPS estaduais/municipais que não alteraram suas leis, não se tem exigido idade mínima, preservando-se temporariamente o direito à aposentadoria especial apenas pelo tempo de contribuição especial. Ressalte-se que essa discrepância é transitória; conforme os entes editem leis complementares, a tendência é uniformizar a exigência de idade também no RPPS, em atendimento ao espírito protetivo da EC 103.
Requisito de serviço público/cargo: Permanece vigente a exigência de um tempo mínimo de exercício no serviço público e no cargo para a concessão de aposentadoria. Para a União (e entes que já adequaram suas normas), exige-se pelo menos 10 anos de efetivo serviço público (ou 20 anos, no caso federal após EC 103, para aposentadorias voluntárias) e 5 anos no cargo em que se dará a aposentadoria. Nos entes que seguem as regras antigas, vale a redação anterior do art. 40 da CF (antes da EC 103), que já previa 10 anos de serviço público e 5 no cargo para qualquer aposentadoria voluntária. Portanto, mesmo na aposentadoria especial, o servidor público não escapa de cumprir um mínimo de tempo vinculado ao ente e ao cargo ocupado.
Servidores com deficiência: No caso da aposentadoria especial da pessoa com deficiência (prevista no inciso I do §4º do art. 40), a EC 103/2019 não supriu a necessidade de lei complementar, mas manteve a autorização para que cada ente estabeleça requisitos diferenciados conforme o grau de deficiência. Na ausência de lei específica, muitos casos têm sido resolvidos judicialmente (mandados de injunção) aplicando-se por analogia as regras da Lei Complementar nº 142/2013 (que rege a aposentadoria do deficiente no RGPS). Em resumo, conforme o grau de deficiência (grave, moderada ou leve), exige-se do servidor deficiente um tempo de contribuição reduzido (por exemplo: 25 anos para homens com deficiência grave, 29 anos se moderada, 33 anos se leve, com reduções de 5 anos para mulheres) – isso além dos requisitos de idade e serviço público que o ente eventualmente estipular. Enquanto a lei complementar local não vem, o direito à aposentadoria especial do servidor com deficiência depende de decisão judicial ou de orientações administrativas baseadas na LC 142/2013, garantindo paridade de tratamento com os segurados do RGPS nessa condição.
Servidores em atividades de risco: Para categorias de risco (inciso II do §4º do art. 40, como policiais), a EC 103/2019 delimitou de forma taxativa quais carreiras podem ter regras diferenciadas (policiais federais, rodoviários, civis dos estados, agentes penitenciários/socioeducativos, etc.). A União fixou novas regras para seus servidores de segurança pública já na própria reforma (exigindo, por exemplo, idade mínima de 55 anos e tempo de contribuição de 30 anos, com 25 anos na carreira policial, para ambos os sexos, no caso de policiais federais – regra cuja eficácia chegou a ser suspensa liminarmente pelo STF quanto à equiparação de gênero). Nos Estados, muitas dessas carreiras de risco eram regidas por leis complementares específicas (por exemplo, a LC federal nº 51/1985, adotada por diversos estados, que permitia aposentadoria policial com 30 anos de contribuição e 20 na função, sem idade mínima). Após a EC 103, tais leis precisarão ser adaptadas para incorporar idade mínima e demais parâmetros da reforma. Até lá, subsistem as regras anteriores para policiais estaduais que não migraram ao regime geral. Em qualquer hipótese, atividade de risco como critério de aposentadoria especial passou a ser interpretação estrita: só profissões expressamente previstas podem ter tratamento diferenciado, vedada a expansão para outras categorias não listadas na Constituição. Tanto que o próprio STF, em decisão recente, julgou inconstitucionais leis estaduais que estendiam aposentadoria especial de risco a guardas municipais, por exemplo, por extrapolar as exceções taxativas do art. 40.
Em suma, os critérios atuais para a aposentadoria especial do servidor público combinam as novas diretrizes constitucionais (exposição efetiva, proibição de conversão de tempo, possibilidade de idade mínima) com as normas infraconstitucionais vigentes (regras do RGPS e leis complementares existentes) e as normas transitórias que mantêm vivos os requisitos antigos onde ainda não houve atualização legislativa. A própria Secretaria de Previdência, logo após a reforma, emitiu orientação no sentido de que as normas anteriores continuariam em vigor nos RPPS subnacionais até a adequação local, garantindo a continuidade do direito à aposentadoria especial conforme as condições então vigentes.
Portaria MTP nº 1.467/2022 e diretrizes oficiais aplicáveis
Diante da complexidade trazida pela EC 103/2019 e da falta de leis complementares imediatas em muitos entes, a Secretaria de Previdência (vinculada na época ao Ministério do Trabalho e Previdência) editou a Portaria MTP nº 1.467, de 02/06/2022. Essa Portaria consolidou e atualizou diversas instruções relativas aos RPPS, entre elas as orientações sobre aposentadoria especial. O objetivo foi uniformizar a aplicação das exceções previstas no art. 40, §4º-A, §4º-B e §4º-C da CF nos regimes próprios, fornecendo segurança jurídica tanto para a União quanto para Estados e Municípios.
Especificamente, a Portaria MTP nº 1.467/2022 estabeleceu instruções para o reconhecimento, pelos RPPS, do direito dos servidores às aposentadorias especiais nas hipóteses já mencionadas. Para a aposentadoria do servidor com deficiência (inciso I do §4º do art. 40), a Portaria disciplina os procedimentos a serem adotados quando o servidor obtiver decisão judicial em mandado de injunção garantindo o benefício, dada a ausência de lei complementar própria. Nesses casos, orienta-se que se aplique, no âmbito administrativo, os critérios correspondentes (grau de deficiência, avaliações multiprofissionais etc.) de forma semelhante ao RGPS, evitando a necessidade de novas ações judiciais para cada caso.
Já no caso da aposentadoria especial por efetiva exposição a agentes nocivos à saúde (inciso III do §4º do art. 40), a Portaria MTP 1.467/2022 reforça a observância da Súmula Vinculante 33 do STF. Ou seja, orienta todos os entes federativos a aplicarem as regras do RGPS na concessão da aposentadoria especial por insalubridade, até que seja editada a lei complementar de cada ente, tal como determina a súmula. A Portaria detalha os meios de prova da exposição especial, os formulários padrão a serem utilizados e referencia os agentes insalubres reconhecidos. Seus anexos contêm listas atualizadas de agentes químicos, físicos e biológicos considerados nocivos e os respectivos períodos de contribuição exigidos (15, 20 ou 25 anos), espelhando a legislação federal (Decreto nº 3.048/1999 e normas correlatas) adaptada às necessidades dos RPPS. Isso padroniza, por exemplo, quais níveis de ruído, calor, eletricidade, agentes infecciosos etc. qualificam o tempo como especial, de forma uniforme em todo o país. Também há diretrizes sobre a emissão da Certidão de Tempo de Contribuição (CTC) indicando tempo especial no regime de origem, sem conversão, conforme as vedações introduzidas pela EC 103.
Destaca-se que a Portaria MTP 1.467/2022 revogou orientações normativas anteriores e passou a ser a referência central sobre o tema no âmbito administrativo federal. Por exemplo, antigas instruções normativas da Secretaria de Previdência Social, como a IN nº 01/2010 que tratava da aposentadoria especial em RPPS por mandado de injunção, foram expressamente revogadas e substituídas pelas novas diretrizes. Assim, a Portaria unificou entendimentos: consolidou tanto a orientação decorrente da Súmula Vinculante 33 (para agentes nocivos) quanto as oriundas de decisões judiciais (mandados de injunção para casos de deficiência ou mesmo para servidores expostos, quando necessário).
Em termos práticos, a Portaria MTP nº 1.467/2022 e seus anexos funcionam quase como um “manual” para os RPPS concederem aposentadoria especial dentro das balizas da EC 103. Ela define procedimentos de avaliação, documentação e concede respaldo normativo para que os regimes próprios reconheçam administrativamente o direito à aposentadoria especial nas hipóteses constitucionais, mesmo antes da edição de leis complementares pelos entes federativos. Por exemplo, a Portaria orienta que, comprovada a exposição permanente a determinado agente nocivo constante de seus anexos por 25 anos, e atendidos os demais requisitos, o servidor tem direito à aposentadoria especial, conforme as regras do RGPS aplicáveis, fundamentando-se diretamente no inciso III do §4º do art. 40 da CF e na Súmula Vinculante 33. Do mesmo modo, no caso de servidor com deficiência, a Portaria viabiliza o processamento do benefício se houver decisão judicial mandamental, fundamentando-se no inciso I do §4º do art. 40 da CF e na equiparação com a LC 142/2013.
Além da Portaria, a Secretaria de Previdência tem publicado notas técnicas e informativas complementares para orientar os gestores dos RPPS. A Nota Técnica SEI nº 12212/2019/ME, emitida logo após a reforma, analisou em detalhes as regras constitucionais aplicáveis aos RPPS e esclareceu pontos como a recepção das normas preexistentes até leis novas serem editadas. Mais recentemente, a Nota Informativa SEI nº 99/2024/MPS reafirmou a uniformidade de regras de aposentadoria nos RPPS e as exceções admitidas pela CF, consolidando o entendimento de que as únicas diferenças possíveis são aquelas taxativamente previstas nos §§4º-A, 4º-B e 4º-C do art. 40 da Constituição. Tais orientações oficiais garantem que os entes sigam o caminho correto: não criem novas hipóteses de aposentadoria especial fora do previsto na Constituição e apliquem corretamente as vedações (como a vedação à conversão de tempo especial após 2019 e vedação de critérios apenas categóricos).
Em suma, a Portaria MTP nº 1.467/2022, em conjunto com as notas e instruções da Secretaria de Previdência, operacionaliza as disposições da EC 103/2019 nos RPPS. Esses normativos infralegais servem de guia até que cada ente edite sua própria lei complementar de aposentadoria especial. Eles asseguram a aplicação imediata e padronizada dos novos comandos constitucionais (como a efetiva exposição e a inexistência de conversão), ao mesmo tempo resguardando direitos já consolidados (pela manutenção temporária das regras anteriores onde couber e pelo respeito às decisões judiciais já proferidas).
Conclusão
A EC nº 103/2019 representou um marco na disciplina da aposentadoria especial dos servidores públicos. Ela reiterou as exceções em que requisitos diferenciados são permitidos (atividades de risco, exposição a agentes nocivos e servidores com deficiência) e impôs novas diretrizes, como a necessidade de lei complementar de cada ente, a possível exigência de idade mínima e a proibição da conversão de tempo especial em comum a partir da reforma. Também positivou na Constituição a noção de exposição efetiva a agentes insalubres, vedando privilégios baseados unicamente na categoria profissional. Em face dessas mudanças, os critérios para concessão da aposentadoria especial no RPPS hoje mesclam elementos antigos e novos: enquanto não sobrevier legislação complementar nos estados e municípios, aplicam-se as normas anteriores (conforme autorizado pelo art. 21, §3º da EC 103), mas sempre em harmonia com os comandos imediatos da reforma (como a vedação de converter tempo especial pós-2019). Aos servidores federais, já se impõem as regras reformadas, sob a égide da Súmula Vinculante 33 e das disposições transitórias da própria EC 103.
A Portaria MTP nº 1.467/2022 revelou-se instrumento crucial para dar efetividade prática a esse novo regime jurídico. Por meio dela, o Ministério da Previdência Social uniformizou entendimentos e procedimentos, orientando os RPPS na análise dos pedidos de aposentadoria especial conforme a EC 103. Desse modo, garante-se que direitos não fiquem suspensos ou à mercê apenas do Judiciário. A Portaria e seus anexos traduzem os comandos constitucionais em diretrizes técnicas claras, seja quanto aos agentes nocivos e tempo de contribuição necessário, seja quanto à documentação comprobatória e demais exigências. Aliada a isso, as notas técnicas e orientações oficiais da Secretaria de Previdência oferecem suporte interpretativo, assegurando que os entes federativos atuem dentro dos limites constitucionais.
Em conclusão, após a EC 103/2019, a aposentadoria especial no serviço público passou por aperfeiçoamentos importantes: reforçou-se o caráter protetivo, sem abandonar a busca pelo equilíbrio financeiro e atuarial do sistema. As mudanças trazidas – especialmente a profissionalização da análise da insalubridade e o fim de atalhos como a conversão de tempo – visam assegurar que esse benefício alcance quem de fato dele necessita, dentro de critérios técnicos e justos. Com as diretrizes normativas hoje disponíveis (texto constitucional, Portaria MTP 1.467/2022 e notas da Secretaria de Previdência), os RPPS dispõem de um arcabouço consistente para conceder aposentadorias especiais de forma legal, segura e uniforme, concretizando os objetivos da Reforma da Previdência sem desamparar os direitos adquiridos dos servidores que dedicaram anos de trabalho em condições diferenciadas.
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